Desde seu início imediato, a canção leva o ouvinte a um senso desmedido de torpor. Macia e estruturalmente com toques de um swing sereno, a canção não demora a apresentar o início da construção dos versos líricos. Feita por uma voz masculina de timbre agradavelmente grave, ela propõe um interessante contraponto em relação à estruturação rítmica. Com seu viés rappeado, a atmosfera lírica dá ao contexto uma fluidez sem rigidez ou trechos truncados, ao passo que a sonoridade parece ser imbuída em uma espécie de linearidade frágil que chega a soar tal como se tivesse sido cortada. Ainda que isso de fato aconteça e seja um fator que acompanha o ouvinte durante toda a execução rítmico-melódica, Long Gone é capaz de desenhar uma energia curiosamente melancólica que paira por toda a sua superfície sonora, capturando a sensibilidade do espectador.
Por meio de seu nascer aveludado através de um sonar sintético agudo, a introdução, sem qualquer sinal de dificuldade, consegue oferecer ao ouvinte agradáveis sensos de conforto e aconchego. Fluindo para um primeiro verso de beat preciso, mas brando em sua estrutura minimalista, a canção passa a ser preenchida por versos líricos de cadência mais branda que aquela oferecida na faixa anterior. Aqui, portanto, existe, nesse contexto, curiosos toques de uma delicadeza mais consciente que permite ao ouvinte se sentir pertencente ao processo de introspecção vivenciado pelo próprio rapper. Afinal, em Let Me Sleep, o personagem lírico parece estar, de bom grado, imergindo em uma atmosfera de autoconhecimento que o deixa emocionalmente mais maduro.
Em meio a um sonar agudo e sintético, o ouvinte se depara com chiados que sugerem certo grau de crueza na construção atmosférica dessa nova introdução. Ainda assim, esse quesito é incapaz de tornar frágil o espectro sonoro. Por mais que soe, de fato, delicada em seu irresistível senso de torpor, ele é maduro e consistente o necessário para fazer o ouvinte imergir no universo sensitivo proposto. Em Amalgamated From The Carbon, o personagem parece lidar com o amadurecimento, com a chegada de novas e decisivas responsabilidades inerentes ao mundo adulto. Uma realidade que, aqui, é retratada com certo grau de dramaticidade interessante que captura a atenção do ouvinte.
Não existe cerimônia. Afinal, no presente cenário, o enredo lírico chega a assumir seu posto antes mesmo que a sonoridade seja, ao menos, despertada. Sob essa nova receita estética, Nothin’ To Explain oferece uma cadência verbal curiosamente swingada que se combina com a surpreendente inserção do sonar de um baixo de groove saliente em sua corpulência melódica. Encorpada e sonoramente consistente, portanto, a canção, conforme vai se desenvolvendo, acaba oferecendo um contraponto interessante entre a maciez melódica e a rapidez com que os versos cadenciados vão sendo formulados.
Aquatic Flames é um EP que defende a atmosfera estrutural do rap. Sem qualquer menção de dúvida. De versos cadenciados, coloquialismos e rimas pobres como uma estratégia de que o enredo fique, de alguma forma, gravado no inconsciente do ouvinte, o material é construído por quatro canções marcantes não apenas pelos seus beats, mas, sim, pelas suas atmosferas entorpecentes que tiram o espectador de suas faculdades lúcidas e o coloca em uma espécie de transe introspectivo.
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