O chimbal surge seco, mas a sua cadência já consegue transmitir certo grau de sensualidade por meio de sua fluidez amaciada. Enquanto ele vai desenhando o ritmo, uma voz digital, como se viesse da transmissão de rádio, surge sobreposta proferindo palavras propositadamente incompreensíveis até levar a introdução ao seu ápice e, consequentemente, ao início do primeiro verso. Regido por uma sonoridade digitalmente ácida e levemente estridente, ele possui uma interessante base rítmica capaz de incitar a dança de uma forma bastante cibernética. O curioso nisso é que, assim que uma voz agradavelmente aguda e aveludada assume seu posto por meio de Michael Joseph Green, Nuclear Star passa a receber flertes da disco music em meio ao seu cenário sintético. De forma surpreendentemente feliz, o refrão, quando atingido, assume vestes estéticas denotativamente melódicas com o auxílio de uma suavidade contagiante vinda do teclado, ao mesmo tempo em que se é possível degustar, em sua totalidade, o groove encorpado do baixo na base rítmica.
Um som aveludado de base estridente surge em solavancos que soam, curiosamente, como uma risada compulsiva. O acompanhando, o sonar do teclado surge adocicadamente grave em sua essência melancólica e cabisbaixa. Entre ligeiros flertes provenientes da estética lo-fi, a música surpreende pela entrada de uma bateria acústica potente e de condução consistente em sua levada amaciada capaz de amplificar tal senso de melancolia fornecido pelo teclado. Desse ponto, é possível perceber que a harmonia vem sendo amplificada gradativamente com as entradas individuais de cada instrumentos em suas respectivas contribuições estéticas. E quando chega a vez da guitarra elétrica, ela invade o cenário com uma distorção ácida e densa que sugere mais densidade ao escopo melódico. Tornando perceptível que o sonar do teclado, na verdade, se refere ao mellotron, Laugh Hotel passa a se tornar ainda mais melancólica em sua energia, a qual se torna visceral quando atinge o refrão. É nesse momento que Green insere suas linhas líricas a partir de uma interpretação mais intensa e, de certa forma, emotiva.
A bateria é quem puxa a introdução desse novo cenário. Repicadas e terminadas sempre por meio do sonar do golpe em um chimbal fechado e seco, a estrutura do instrumento aparece com certo grau de complexidade em seu movimento rígido, mas, curiosa e simultaneamente, macio. Permitindo a fluidez para a melodia do primeiro verso, o instrumento destaca uma ambiência sonora regida pela base do trip hop de forma a rememorar a estética de canções assinadas pelo Gorillaz. Com auxílio da gravidade ácida e adocicada do hammond, Kentucky Straight atinge seu ápice a partir de uma melodia swingada que remete ao reggae, mas, mais precisamente, ao seu universo rítmico. Com menções ao dub, a canção enaltece o timbre agudo-aveludado nasal e, simultaneamente, delicadamente rasgado de Green. Com essa gama de texturas, Kentucky Straight se torna uma canção saliente e melodicamente irresistível pela sua maciez estonteante.
Pulp é um álbum versátil, melodicamente equilibrado e experimental no que se refere a união de texturas aparentemente desconexas entre si. Afinal, somente por entre as três primeiras faixas, Green proporcionou uma interação entre ambientes digitais e sintéticos com o swing e uma densidade esteticamente melancólica. E tudo isso de forma madura e musicalmente ampla.
Compreendendo um total de 12 faixas, o álbum mostra um Michael-Joseph Green transitando por ambientes industriais, mas também em outros românticos e sensuais em suas estruturas, como é o caso de Six Underground. Há também menções ao trip hop como acontece em Agent Orange e Fever Dream.
Ainda assim, em meio à sua extensão de 42 minutos de duração, Pulp tem, nas suas três primeiras faixas, seus principais e mais fortes cartões de visita. Essas faixas atrairão mais ouvintes que, certamente, ficarão intrigados em mergulhar mais nessa viagem sensorial proposta por Green.
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